No site da Câmara Municipal de Carmo da Cachoeira, Maria das Graças Menezes Mourão conta que os Rattes tiveram um representante de sua linhagem no caminho para as minas, bem no início da colonização: Pedro de Rates Henequim.
Passemos primeiro à história.
Nascido em Lisboa no ano de 1680, Pedro de Rates Henequim era filho bastardo de Francisco Henequin, um cônsul calvinista holandês, tido com Maria da Silva de Castro, católica portuguesa. Quando pequeno, fora tomado sob os cuidados de um padre, tendo estudado no colégio jesuíta de Santo Antão. Aos dez anos volta a morar com o pai, um cônsul holandês. Com esta proximidade, ele entra em contato com idéias reformistas, porém, continua a ter uma rígida educação católica.
Em 1702, se vê diante de dois caminhos: ou viver na Holanda, como sugerido pelo pai, ou ir para a Colônia. A época era de descobertas de ouro nas Minas Gerais do Brasil. Aconselhado pelo seu tutor, que temia um contato maior com o calvinismo, Henequim segue para a Colônia. Lá se depara com uma realidade caótica de línguas, costumes, crenças, culturas e raças juntas num mesmo lugar. Chegou a Minas Gerais, onde viveu nas regiões de Sabará, Ouro Preto e Serro do Frio. Maria das Graças Menezes Mourão sustenta que Pedro Henequim chegou a ser Superintendente das Minas do Rio das Velhas.
Em 1722, decide voltar a Portugal. Henequim não só acreditava que haveria mil anos de felicidade terrena, como afirmava que esse reino de felicidade, conhecido como 5º Império, se daria no Brasil. Assim, tenta estabelecer contato com o Infante D. Manuel, irmão de D. João V, para oferecer-lhe a coroa do Brasil, pois, no seu entender, sob domínio português, o paraíso terrestre não seria possível. Em paralelo, seus planos de se tornar religioso naufragam devido a um imprevisto amoroso: Henequim se apaixona por uma jovem menina chamada Joana, de 14 anos e acerta o casamento. Logo muda de idéia e tenta fugir do matrimônio, o que envolve uma situação de troca de identidade, com Pedro de Rates Henequim se fazendo passar por outrem. Aos 51 anos, finalmente se rende e se casa com Joana para, logo em seguida, quatro meses depois, abandoná-la com sua filha.
Em 1740 é preso, ao retornar de uma visita a D. Manuel, acusado de envolvimento em uma conspiração contra o rei D. João V. Preso, diversas circunstâncias trazem à tona uma cosmologia fantástica tecida por Pedro Henequim, que o tornava perigoso para duas instituições: a Igreja e o Estado português. Suas idéias totalmente avessas aos ensinamentos da religião católica o colocavam na posição de herético.
Bom em português, para provar que o homem foi criado por mais de uma entidade, Henequim serviu-se do texto bíblico que diz: ''Façamos o homem à nossa imagem e semelhança''. Escreveu ele: ''Se é 'façamos', é mais do que um''. Ele não aceitava o plural majestático. Ele também sustentava que os anjos tinham sexo, e que assumem, muitas vezes, papéis materiais. Para ele, a Virgem Maria não tinha orifício vaginal e possuía um membro masculino, sendo assim um ser andrógino ainda mais perfeito, por conter as qualidades do homem e da mulher. O paraíso, que estava no Brasil, conseguira sobreviver ao dilúvio graças a rodas que tinha embaixo de si. Nas bananas que alimentavam os escravos e nasciam em pencas por toda parte, ele identificou o fruto da perdição humana. Nas folhas das palmeiras pensou ter lido mensagens escritas (em português, evidentemente) pelo próprio Adão. Inspirado em pinturas medievais, dizia que Adão e Eva não tinham umbigo, pois o primeiro homem tinha sido feito do barro; e a primeira mulher, da costela dele. Por isso Deus não tinha cortado o cordão umbilical de nenhum dos dois!
Um vizinho, com vocação de delator, fez a denúncia à Inquisição. Cristão fervoroso, Henequim não esperou ser preso. Correu solícito aos tribunais, certo de que iria sair de lá absolvido e louvado. Ofereceu-se para escrever seus depoimentos porque temia não ser bem entendido. Não lhe foi permitido. Após um ano preso na casa de um Desembargador, Henequim foge, mas é recapturado dias depois. Transferido para os cárceres do Santo Ofício, onde foi possível garantir o sigilo que o rei exigia sobre o caso, passa a responder a processo por suas idéias religiosas. Henequim pretendia escrever uma trilogia detalhando o saber absoluto e final de que era detentor pela graça de Deus. A escrita parece ter sido o meio considerado por ele ideal para a apresentação dessa nova verdade: quando é preso pela Inquisição e convidado a expor seu pensamento, pede tinta, papel e sua Bíblia (o que lhe é recusado).
Começa, então, o jogo de cartas marcadas, que só tem fim em 1744, quando, sentenciado como herege, Pedro de Rates Henequim foi estrangulado com o garrote, e seus restos, de acordo com a sentença, foram incinerados e espalhados ao vento, para que “nem dele nem de sua sepultura possa haver memória alguma”.
Contada a história, algumas questões se me apresentam:
1. Em que período Pedro de Rates Henequim teria sido Superintendente das Minas do Rio Velho, uma vez que os registros a que tive acesso dão conta apenas do provisionamento de Manoel Borba Gato (ele mesmo, o bandeirante) na função?
2. Existem registros de descendência brasileira de Pedro Henequim?
Fontes: Trabalho apresentado ao NP 08 - Tecnologias da Informação e da Comunicação, do V Encontro dos Núcleos de Pesquisa da Intercom, por Prof. Dr. Márcio Souza Gonçalves, Ana Carolina Rodrigues e Zaira Brilhante de Albuquerque; Um visionário na corte de D. João V - Revolta e milenarismo nas Minas Gerais, de Adriana Romeiro.
Passemos primeiro à história.
Nascido em Lisboa no ano de 1680, Pedro de Rates Henequim era filho bastardo de Francisco Henequin, um cônsul calvinista holandês, tido com Maria da Silva de Castro, católica portuguesa. Quando pequeno, fora tomado sob os cuidados de um padre, tendo estudado no colégio jesuíta de Santo Antão. Aos dez anos volta a morar com o pai, um cônsul holandês. Com esta proximidade, ele entra em contato com idéias reformistas, porém, continua a ter uma rígida educação católica.
Em 1702, se vê diante de dois caminhos: ou viver na Holanda, como sugerido pelo pai, ou ir para a Colônia. A época era de descobertas de ouro nas Minas Gerais do Brasil. Aconselhado pelo seu tutor, que temia um contato maior com o calvinismo, Henequim segue para a Colônia. Lá se depara com uma realidade caótica de línguas, costumes, crenças, culturas e raças juntas num mesmo lugar. Chegou a Minas Gerais, onde viveu nas regiões de Sabará, Ouro Preto e Serro do Frio. Maria das Graças Menezes Mourão sustenta que Pedro Henequim chegou a ser Superintendente das Minas do Rio das Velhas.
Em 1722, decide voltar a Portugal. Henequim não só acreditava que haveria mil anos de felicidade terrena, como afirmava que esse reino de felicidade, conhecido como 5º Império, se daria no Brasil. Assim, tenta estabelecer contato com o Infante D. Manuel, irmão de D. João V, para oferecer-lhe a coroa do Brasil, pois, no seu entender, sob domínio português, o paraíso terrestre não seria possível. Em paralelo, seus planos de se tornar religioso naufragam devido a um imprevisto amoroso: Henequim se apaixona por uma jovem menina chamada Joana, de 14 anos e acerta o casamento. Logo muda de idéia e tenta fugir do matrimônio, o que envolve uma situação de troca de identidade, com Pedro de Rates Henequim se fazendo passar por outrem. Aos 51 anos, finalmente se rende e se casa com Joana para, logo em seguida, quatro meses depois, abandoná-la com sua filha.
Em 1740 é preso, ao retornar de uma visita a D. Manuel, acusado de envolvimento em uma conspiração contra o rei D. João V. Preso, diversas circunstâncias trazem à tona uma cosmologia fantástica tecida por Pedro Henequim, que o tornava perigoso para duas instituições: a Igreja e o Estado português. Suas idéias totalmente avessas aos ensinamentos da religião católica o colocavam na posição de herético.
Bom em português, para provar que o homem foi criado por mais de uma entidade, Henequim serviu-se do texto bíblico que diz: ''Façamos o homem à nossa imagem e semelhança''. Escreveu ele: ''Se é 'façamos', é mais do que um''. Ele não aceitava o plural majestático. Ele também sustentava que os anjos tinham sexo, e que assumem, muitas vezes, papéis materiais. Para ele, a Virgem Maria não tinha orifício vaginal e possuía um membro masculino, sendo assim um ser andrógino ainda mais perfeito, por conter as qualidades do homem e da mulher. O paraíso, que estava no Brasil, conseguira sobreviver ao dilúvio graças a rodas que tinha embaixo de si. Nas bananas que alimentavam os escravos e nasciam em pencas por toda parte, ele identificou o fruto da perdição humana. Nas folhas das palmeiras pensou ter lido mensagens escritas (em português, evidentemente) pelo próprio Adão. Inspirado em pinturas medievais, dizia que Adão e Eva não tinham umbigo, pois o primeiro homem tinha sido feito do barro; e a primeira mulher, da costela dele. Por isso Deus não tinha cortado o cordão umbilical de nenhum dos dois!
Um vizinho, com vocação de delator, fez a denúncia à Inquisição. Cristão fervoroso, Henequim não esperou ser preso. Correu solícito aos tribunais, certo de que iria sair de lá absolvido e louvado. Ofereceu-se para escrever seus depoimentos porque temia não ser bem entendido. Não lhe foi permitido. Após um ano preso na casa de um Desembargador, Henequim foge, mas é recapturado dias depois. Transferido para os cárceres do Santo Ofício, onde foi possível garantir o sigilo que o rei exigia sobre o caso, passa a responder a processo por suas idéias religiosas. Henequim pretendia escrever uma trilogia detalhando o saber absoluto e final de que era detentor pela graça de Deus. A escrita parece ter sido o meio considerado por ele ideal para a apresentação dessa nova verdade: quando é preso pela Inquisição e convidado a expor seu pensamento, pede tinta, papel e sua Bíblia (o que lhe é recusado).
Começa, então, o jogo de cartas marcadas, que só tem fim em 1744, quando, sentenciado como herege, Pedro de Rates Henequim foi estrangulado com o garrote, e seus restos, de acordo com a sentença, foram incinerados e espalhados ao vento, para que “nem dele nem de sua sepultura possa haver memória alguma”.
Contada a história, algumas questões se me apresentam:
1. Em que período Pedro de Rates Henequim teria sido Superintendente das Minas do Rio Velho, uma vez que os registros a que tive acesso dão conta apenas do provisionamento de Manoel Borba Gato (ele mesmo, o bandeirante) na função?
2. Existem registros de descendência brasileira de Pedro Henequim?
Fontes: Trabalho apresentado ao NP 08 - Tecnologias da Informação e da Comunicação, do V Encontro dos Núcleos de Pesquisa da Intercom, por Prof. Dr. Márcio Souza Gonçalves, Ana Carolina Rodrigues e Zaira Brilhante de Albuquerque; Um visionário na corte de D. João V - Revolta e milenarismo nas Minas Gerais, de Adriana Romeiro.
9 comentários:
Roberto. Conheça um pouco esta região. Procure ler:
Jurisdição dos Capitães, de Marcos Pulo de Souza Miranda.Editora Del Rey. Belo Horizonte. 2003.O autor é natural de Andrelândia, Sul de Minas. Exerce a titularidade da Promotoria de Junstiça da Comarca de São João Evangelista-Mg(dadis de 2003). O assunto tratado por ele teve, a inicial do processo assinado pelo juiz de paz do distrito da Boa Vista, que após(...) passou a ser a Freguesia de Cachoeira de Rates."
Parabens pelo seu trabalho,sou um descendente do tal Pedro Henequim,minha familia provem de minas gerais e no ano de 1902 estabeleceuse em Curitiba parana,por uma grande porcao de terra oferecida para minh familia qeu con a passar dos anos foi perdendendo pela ma adminstracao e hoje morro de aluguel na alemanha.
Abracos ate breve!!!!
Acessei por curiosidade o seu blog e vi o seu comentário sobre o Pedro de Rates Henequim. Bem, Rates é o nome de uma freguesia em Portugal, o que significa que muitos que nasceram ali, ficaram conhecidos nas Minas como Fulano de Rates. Além do mais, existe o santo Pedro de Rates, em homenagem inclusive a freguesia. Disso podemos concluir que os Rates existentes no Brasil nao sao necessariamente descendentes do Pedro de Rates Henequim, que, a julgar pelas fontes, nao deixou herdeiros no Brasil. Ele teve sim um filho - Florencio - em Lisboa. Tudo indica que nas Minas ele tenha se passado para alguma ordem religiosa, o que fortalece ainda mais o meu argumento da inexistencia de filhos nas Minas.
Um grande abraço
Adriana Romeiro
Adriana Romeiro é professora de História da UFMG. Embora não tenha mencionado, certamente, por absoluta modéstia, ela é "apenas" a maior estudiosa brasileira da vida de Pedro de Rates Henequim, autora de "Um Visionário na Corte de D. João V: Revolta e milenarismo nas Minas Gerais", que descreve a trajetória de Pedro de Rates Henequim, que foi morto pela Inquisição por conspirar contra o rei de Portugal, Dom João V. Minha postagem sobre o assunto, aliás, baseou-se no trabalho da Profª Adriana. Respondida, pois, a questão 2.
olá!!!!
parabéns pelo seu trabalho!!eu li e reli bastante sobre tudo que se relaciona ao nome da familia que tenho muito orgulho!!!conheço muito pouco da familia,esse sobre nome que recebi veio do meu pai paulo henequim,que veio do seu pai estevan henrique henequim,por a caso eu vi tudo isso e achei maravilhoso saber que não somos só um nome!!!obrigada por dar a oportunidade de saber um pouco mais!!
aline dos santos henequim
parabéns pelo blog!
Acredito que Pedro Rates não deixou herdeiros no Brasil e apesar de ter passagens em Minas e Rio de Janeiro (Petrópolis) não há fatos verídicos que comprovem a exitência de tais heideiros como foi explicado com louvor pela prof. Adriana. Também sou um Rates e gostaria de saber mais sobre a origem dos antepassados. Desde já agradeço,
Tiago Rates
Acredito que Pedro Rates não deixou herdeiros no Brasil e apesar de ter passagens em Minas e Rio de Janeiro (Petrópolis) não há fatos verídicos que comprovem a exitência de tais heideiros como foi explicado com louvor pela prof. Adriana. Também sou um Rates e gostaria de saber mais sobre a origem dos antepassados. Desde já agradeço,
Tiago Rates
Olá! Meu nome é Liriane Bher Silvério e sou estudante de Jornalismo em Curitiba. Em uma das minhas matérias, preciso montar minha árvore genealógica e estou descobrindo coisas fantásticas. Uma delas é que posso ser descentende de Pedro Ratter Henequim. Sou neta de Leonor Henequim, que foi filha de Eduardo e Graciosa Henequim. Gostaria muito de receber alguma ajuda neste sentido, caso tenham alguma informação. Minha família é de Curitiba desde sempre (pelo menos até onde eu sabia). Agora acho que podemos sim ter alguma ligação com Pedro Henequim de Minas Gerais. Lerei este livro da Adriana Romeiro com toda certeza! :) (contato: liriane.kampf@gmail.com)
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